domingo, 10 de abril de 2011

Matéria da Coluna do jornal "Completo" de 09 de abril de 2011



O  QUE HOUVE COM A IDENTIDADE CULTURAL EM CABO FRIO?

Estava eu a prosear com um amigo, artista, do Rio de Janeiro, que já frequentara Cabo Frio até 12 anos atrás e este, após passar alguns meses aqui, deu-se conta de que as festas de rua desapareceram. "Onde está a festa julina da Rua Roberto Silveira no Caiçara? As festas nas ruas do bairro Guarani e todas as do bairro São Cristóvão e o tradicional bloco do Costa Azul na Praça Porto Rocha e a movimentada "feirinha" do Boulevard Canal? " Não creio ter a ver com inciativa pública. Mas algo que encolheu por si só. Fenômeno. Não são shows de prefeitura. São manifestações típicas. Onde estará a causa real?
O quanto será que aqueles que visitam Cabo Frio levam de nossa identidade cultural? Além da boa sensação de se banhar em nossas belas praias? 

Após uma breve conversa, fiquei a refletir sozinho sobre as vertentes culturais da cidade e concluí assim:

A MÚSICA - Apanhei-te cavaquinho? Portinho Bohemio? Festival da Canção? Festival Gospel do Amaury Valério? Começar de Novo? Rock Humanitário? Shows em casas noturnas? São movimentos fortes? Sim. Todos têm o seu valor, o seu peso, mas não sei de nenhum deles que sobreviva sozinho. Que tenha adquirido força para se auto-sustentar. Precisam de mais apoio. De maior atenção do empresariado e do poder público. Precisam, na verdade de impulso aos seus projetos para atingirem outras dimensões e fomentar a procura.

AS ARTES PLÁSTICAS - Estes têm um Corredor Cultural, mas será que é suficiente para arte tão refinada, tão seletiva e que atrai turista de maior poder aquisitivo? Podemos considerar que um turista possa pagar R$20 que seja para ir ao teatro, mas quantos podem pagar R$2.000,00 ou que seja R$20.000,00 por uma tela? Quantos podem ter seu próprio atelier? Cito alguns entre tantos, o da Eliane Guedes, o da Ellen Mona, o da Gladys Reveilleau, o do Foraux... são todos merecedores de um Salão das Artes, de Encontros anuais e Intercambio com outros estados e com o mundo já que temos tantos artistas e tão diferenciadas técnicas. Além de um grande espaço coberto, precisam da realização de um encontrão anual, à se tornar atratividade nacional, afinal, quem paga uma fortuna por uma tela, pode vir para Cabo Frio de avião;

O TEATRO - Território formado por gente difícil, gente dividida, não muito diferente dos artistas de carnaval. Mas acreditamos ser passageiro, as mudanças e a renovação ocorre de 40 em 40 anos e esta nova cara do teatro já desponta no horizonte. Temos um único teatro (que produz), fora dois ou três espaços ociosos. Os artistas continuam surgindo, sejam em cursos ou festivais, mas ainda continuam a não emplacar por aqui. Alguns acabam por arrumar as malas e produzir fora. Precisamos de mais centros culturais, mais espaços, para reciclagem do artista, intercâmbio e laboratório de ensaio. O problema não está no tamanho e sim na quantidade. Não precisamos de um teatro de 800 lugares e sim de 3 com 300 cada, já que 70% dos eventos não conseguem lotar um espaço de 270 lugares. temos festivais de teatro importantes como é o caso do Festival de Esquetes - Fesq e o Festival Estudantil de Teatro, além da Mostra Infantil. Mas basta? E o teatro de rua? E as temáticas históricas que deveriam atrair os visitantes e deixar gravado em suas memórias o registro da cidade por onde passaram. Acho que o artista de teatro também precisa de mais logística, mais apoio;

O ARTESANATO - Este, um dos mais fortes (por sua organização) e no entanto ainda não emplacou como uma superpotência, pois não conquistara independência total e nem, sequer um espaço próprio que fomentasse sua procura turística - Não se pode confundir com feira de produtos da china (não desmerecendo os trabalhadores - mas estamos falando de identidade cultural);

A DANÇA - Movimento independente, forte apenas em suas produções de academias, para aqueles que têm espaço físico, mas ainda frágil para os que são apenas cias de dança e também precisam de apoio logístico - Estes realizam seus maiores trabalhos no Teatro Municipal de Cabo Frio e acabam por conseguir deixar na memória de seus entusiastas seus grandes feitos, no entanto ainda falta tender mais para projetos que contenham a história da cidade, do povo cabofriense. Mas rememora-se muito por festivais como é o caso do Eaferj, agora Festival Nacional de Danças e as formaturas de fim de ano das academias;

A LITERATURA - Se não fosse pela Semana Teixeira & Souza, estariam apagados os literatos, os escritores de Cabo Frio? Acho que podemos nos assegurar de que com a força de uma entidade como a ART POP não ficaríamos à margem das produções do Estado, já que a mesma reúne artistas e em especial de literatura de todo o Brasil somando e trazendo seriedade, respeito e responsabilidade. E com certeza também somam os artistas independentes de Cabo Frio, mas até onde vão?;

O AUDIOVISUAL - O que dizer do audiovisual? Conhecemos sim, nós cidadãos daqui, além do evento Curta Cabo Frio, o Taberna Filmes (que por sinal formado por jovens muito competentes), temos também o trabalho de Thuany Motta e seu grupo de realizadores. Mas será que eles têm ou já tiveram oportunidade real de incrustar suas produções nas mentes dos transeuntes, dos visitantes? Alguém já perguntou isso a eles? Temos um único Festival de Cinema na Cidade, que é o curta Cabo Frio e se também não fossem o Cine Mosquito de nosso companheiro Jiddu Saldanha e as exibições do Taberna, não seríamos nada em matéria de produção audiovisual. Não deixando de citar o fato de que temos um cineasta de talento nacional na região, um documentarista sério, que é o sr. Milton Alencar Jr.;

O ENCONTRO DE CORAIS - Historicamente apoiado pelo poder público e perto da conquista de grande apoiador privado, pois, já tem estrada e respeito para tal - Mas o sucesso deste fica por conta exclusiva do maestro Rui Capdevile. E sem o maestro, como seria? Alguém se importou em perguntar o que é preciso para manter esta artéria viva?;

ASSOCIAÇÃO CULTURAL TRIBAL - Entidade ainda um pouco fechada em seus propósitos. Aparentemente apolítica mas, permeada por forças ocultas que tratam de buscar recursos para benefício único e exclusivo da entidade. Mas destaca-se pelo apoio às iniciativas de seus membros, como é o caso do Fesq e das iniciativas de cinema, artes plásticas e teatro pela cidade, no campo periférico;

FESTA PORTUGUESA, FESTIVAL DO CAMARÃO NA PRAIA DO SIQUEIRA, FESTIVAL DO MARISCO NO PERÓ - entre outras iniciativas de sucesso, mas estas não podem contar pois são iniciativas com forte parceria e/ou exclusividade do poder público que da mesma forma é responsável pelo patrimônio da Cultura que é o caso do Forte São Matheus, do Charitas, da Biblioteca Walter Nogueira, do Teatro Municipal e da Casa dos 500 anos que por sinal... salvem-na! (na verdade, acho que ela só troca de lugar). Daí vai entrar a Casa de Wolney, o Convento, o excelente trabalho realizado na Casa Scliar, mas não quero discorrer sobre patrimônio histórico, pois é outra conversa;

O CARNAVAL - Este sim, é o mais forte, mas será que carimba sua marca, sua grossa camada de cultura, que converge tantas correntes artísticas numa só, na mente dos visitantes e mesmo na sociedade? Estamos no Estado do Rio de Janeiro, afinal, pertinho da capital onde temos o melhor carnaval do mundo. O que irá atrair o turista? Destaca-se por seu maior investimento e pelo maior número de pessoas, escolas e grupos estruturados em torno de uma realização de larga escala. Temos um grande destaque, este sim, que é a própria Morada do Samba, que fica fotografada na mente dos que por aqui passam. Algo de grandioso em espaço reservado para Carnaval no interior do Estado.

Resumindo, caros amigos. Será que tudo o que não dá certo é exclusiva falha do poder público ou também que falte uma integração maior dos artistas, maior unidade e preparo em suas exposições, idéias e projetos? Ou será que a falha está em produzir apenas em seu próprio benefício?

Pensem bem no exemplo que vou dar: Um músico certa vez disse: "Não me importa mais que eu não tenha público, o que importa é que a prefeitura está pagando meu cachê e eu vou cantar e vou embora, mesmo que seja para as paredes"

Até a próxima! Boa semana!

Anderson Macleyves  - é ator, professor, psicanalista e diretor do Teatro Municipal de Cabo Frio – email: anderson.macleyves@gmail.com 

Nenhum comentário:

Postar um comentário